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domingo, 7 de dezembro de 2008

Vida no Xaraiés


Vida no Xaraiés

Aqui me encontro no meio dos 250 mil kilômetros quadrados de extensão
da maior planície alagada do mundo. Meu destino é a aldeia de
Perigara. Nada do que me diziam, nada do que eu li me prepararam
para o que estou vendo agora.
Há alguma horas atrás, saí da rodovia transpantaneira, estrada de
terra bem conservada e suas mil e uma pontes, para o rio Cuiabá.
Desço junto com o rio, lentamente, na minha voadeira carregada e
motor 25 hp. Os antigos bororos do rio perigara, mais conhecido como
São Lourenço, são os meus guias neste labirinto imprevisível de águas
paradas e correntes, temporárias ou permanentes. Índios pantaneiros,
grandes conhecedores do pantanal, desde o tempo em que a região era
conhecida como "mar dos Xaraiés".
Sua língua é o Bororo mas também adotaram o "pantanês" como sua língua
. O "pantanês" é o que eu chamo o linguajar do povo do pantanal. É
um tipo de português com característica própria, muitas vezes difícil
de entender e muitas palavras unicamente usadas na região. Acho que
vou ter que me virar e aprender!
Sentar aqui neste barco e ouvir este barulho me faz lembrar meus
tempos de floresta amazônica. A natureza animal, que parecia se
esconder lá no alto rio negro, aqui parece se exibir. Uma quantidade
surpreendente de aves alça vôo enquanto navegamos sobre os atalhos
fluviais que usamos, chamados corixos. Inúmeras garças, colhereiros,
cabeças secas acompanham a voadeira em um vôo que parece escoltar-nos
nas curvas das águas. Dentre elas, se destaca o Tuiuiú, o símbolo do
pantanal. A ave de um metro e sessenta de altura e quase três metros
de envergadura não deixa dúvidas de que é o rei deste lugar.
Durante o trajeto, me comove como a natureza convive entre si aqui no
pantanal. Jacarés, capivaras, Tuiuiús e outras aves dividindo o mesmo
espaço, creio que mantendo uma distância segura entre si, mas com uma
proximidade que parecem que não fazem parte de uma cadeia alimentar.
Aliás, jacaré e o que não falta aqui chegando a reunir mais de 20
indivíduos em uma só pequena praia fluvial.
Aqui tudo parece tamanho "G". As capivaras são imensas e cheguei a
confundir algumas com antas. As aves são grandes, os jacarés estão
visivelmente de "bucho cheio" e os peixes são os maiores que eu já vi.
Acostumado a pescar peixes com 20 a trinta centímetros de comprimento
que pescava esporadicamente com meu pai lá no mar de minha cidade natal, Vitória,
aqui, estes peixes são as iscas. Peixes como Cacharas, Pintados, Jaús
e pacus povoam os rios daqui. O famoso pintado, por exemplo, pode
chegar a 2 metros de comprimento e pesar 80 kilos. Mas nada comparado
ao tubarão dos rios, a Piraíba. Peixe que com 60 kilos ainda é
considerado filhote e pode chegar a 2 metros de comprimento, 300 kilos
e pasmem 1,4 metros de circunferência. Seu tamanho mínimo de pesca
legalizada é de 1,2 m de comprimento. Pena que o mesmo só ocorre na
bacia amazônica e Bacia Tocantins-Araguaia e que sua carne é ruim, ao
contrário da maioria dos peixes encontrados aqui. Peixes grandes
aqui não faltam e começar a descrevê-los todos aqui não seria possível
em menos de algumas dezenas de páginas. Adiantando um pouco a
estória, eu só sei de uma coisa; eu nunca mais trago carne seca para
este lugar.!!! Pesquei quase todos os dias, e quando não pescava
ganhava os peixes e não eram peixes "ralé" não meu irmão! Eu ganhava
era dourado e cachara... Só o filé do local! Aqui, não é só a
quantidade de espécies e sim quantidade de peixes que impressiona. É
tanto peixe que parece um tanque de criação...
A geografia local também chama a atenção. Ao contrário das grandes
árvores amazônicas, uma vegetação mais baixa forma a flora ribeirinha
com trechos aonde podemos enxergar a verdadeira imensidão desta
planície. Não me surpreende isto tudo alagar facilmente. É tempo de
vazante e muitos trechos já estão secos e a altura do barranco dos
rios não passa nem de um metro e meio. As águas correm de forma bem lenta e na
época de inundações quase param.
Continuo o meu caminho através das curvas sinuosas do leito do
Cuiabá e entro no São Lourenço. Rio menos caudaloso, de águas
barrentas, mas como regra local, muito bom de peixe. A quantidade de
corixos parece aumentar e posso ver também inúmeras lagoas ao longo de
seu leito. A quantidade enorme de plantas aquáticas, em sua maioria
aguapés, chega a bloquear o leito para a navegação em alguns trechos
dos corixos.
Horas se passam e após algumas visitas estratégicas a alguns
ribeirinhos chegamos ao nosso destino final, Perigara.
A recepção foi muito calorosa e me parecem indivíduos bem simpáticos.
As suas crianças são visivelmente saudáveis. Também pudera! Em um
lugar como este, só passa fome quem quer. Depois do deslumbramento
da viagem, minha atenção se volta para a população já que esta é o
motivo da minha vinda. Acredito que não encontrarei obstáculos para
um bom relacionamento com as pessoas daqui. Com certeza, será mais uma
das grandes experiências da minha vida no interior deste grande país.
Durante minha estadia vivo a vida pantaneira no seu modo mais
natural, mas isto é uma outra estória para ser contada em um outro
momento.........
FUI.........................

Um comentário:

Gilberto Granato (Arawãkanto'i) disse...

Fala Duda. Traz uns kilos de carne de caititu para fazermos aqui...
o email que me pediu wpizzolb@uol.com.br

e vou te dar quatro sugestões de livros de crônicas, para você ler em área;
mario prata - cem crônicas escolhidas
rubem braga - 100 melhores crônicas
luís fernando veríssimo - qualquer um...
o rei da noite - joão ubaldo ribeiro

você vai gostar!
vou pegar uma chupeta....